sexta-feira, 18 de junho de 2010

A TECNOLOGIA POR DENTRO DAS CONSTRUÇÕES URBANAS: ENCANAMENTO MODERNO, Uma solução para a vida nas cidades.

Por:FABÍULA THEREZA PESSOA DE A. FERREIRA,LETÍCIA MARTINS GOMES e MARINA CUNHA DA SILVA




RESUMO
O presente artigo tem como abordagem o tema referente ao encanamento moderno, perpassando pelo surgimento das cidades industriais, as dificuldades encontradas pela população para viver nesse contexto e concluindo com a invenção do encanamento e as melhorias que trouxe para a vida nas cidades. Aborda a relevância dessa nova tecnologia no auxilio ao saneamento básico e os benefícios dessa higienização.


Marc Bloch, em seu livro Apologia a história, relata um dos momentos do desenvolvimento do pensamento histórico: o da obsessão das origens. Por muito tempo os historiadores buscaram o início dos fatos para justificar ou condenar o presente, transformando a análise histórica em julgamento e os eventos em causa e conseqüência. O desenvolvimento do pensamento histórico possibilitou perceber que nem sempre o conhecimento dos primórdios serve para explicar um fenômeno.
O presente artigo se propõe a falar sobre o momento pré-advento do encanamento moderno nas cidades, sua utilização e os benefícios que ele possibilitou para a vida nas cidades. Torna-se relevante ressaltar que o uso do encanamento moderno, juntamente com o advento do saneamento básico, em todas as épocas e lugares teve sua concentração nas zonas urbanas e foi privilégio das camadas mais abastadas da sociedade. O acesso democrático ao saneamento é algo recente e que também se restringe geograficamente.
Na Europa, a cidade, no período anterior a utilização do encanamento moderno, é conhecida como a cidade industrial. As fábricas eram o centro do novo complexo urbano e todas as funções da cidade se voltavam para elas. Geralmente se encontravam próximas às estações ferroviárias ou aos rios, sendo boa parte dos detritos da produção jogados nos rios, ocasionando a poluição da água e, conseqüentemente, tornado-a imprópria para o consumo e higiene. Não existia um planejamento funcional das atividades, portanto as fábricas se organizavam e eram construídas no lugar que melhor atendesse às suas necessidades, sem se importar com questões ambientais e/ou urbanísticas. Os lugares de moradia eram, como apresenta Mumford:
muitas vezes, situados dentro dos espaços que sobravam entre fábricas, galpões e pátios ferroviários [...] Era muito freqüente serem construídas em terras cheias de cinzas, vidros quebrados e restos, onde nem mesmo a grama podia deixar raízes [...] Dia após dia, o mau cheiro dos dejetos, o negro vômito das chaminés e o ruído das máquinas martelantes ou rechinantes, acompanhavam a rotina doméstica. (MUMFORD, 1965)

As cidades industriais que cresceram com base em cidades antigas tiveram suas antigas casas transformadas em alojamentos, servindo de abrigo para um grande número de pessoas, muitas vezes abrigando diversas delas em um só quarto. Para a construção dessas novas casas eram utilizados materiais baratos e não havia a existência de alicerces no chão. Muitas vezes essas casas eram construídas fundo a fundo com outras, ocasionando falta de luz do sol e ventilação em boa parte dos quartos.
A questão referente à higiene nessas novas cidades era precária. Os restos eram despejados nas ruas e ficavam expostos, os esgotos eram abertos e exalavam odores fétidos nas ruas das cidades. Esse contexto de insalubridade trouxe certos problemas para a população, como o aumento do número de ratos, transmissores da peste bubônica, percevejos, piolhos, propagadores do tifo e inúmeras moscas. Além disso, os ambientes escuros e úmidos dos quartos formavam um ambiente ideal para a proliferação de bactérias.
Segundo MUMFORD:
a ausência de encanamentos e de higiene municipal criava um mau cheiro insuportável nesses novos bairros, e se a propagação de excremento expostos, juntamente com a infiltração nos poços locais, significava uma propagação correspondente de febre tifóide, a falta de água era ainda sinistra, porque afastava por completo a possibilidade de limpeza domestica ou de higiene pessoal.
(MUMFORD, 1965)

O fornecimento de água era precário, sendo a água encontrada nos porões das moradias. As classes mais baixas não tinham acesso ao fornecimento de água e não possuíam reservas da mesma, permanecendo boa parte dos dias sem água. A pobreza higiênica estava, assim, difundida: falta de sol, de água potável e de ar limpo. O agrupamento dessas condições precárias propiciava uma péssima qualidade de vida e dificultavam as expectativas de vida dos habitantes dos centros urbanos.
A falta de encanamentos causou diversos transtornos à sociedade, sendo o maior deles a sujeira. Devido ao grande número de pessoas residindo nas cidades, o acumulo de sujeira era elevado, gerando doenças e mau cheiro por todo lugar.
Um exemplo claro da insalubridade ocasionada pela falta de métodos capazes de drenar toda a poluição gerada pelas populações é a cidade do Rio de Janeiro. No período oitocentista, a cidade enfrentou inúmeras mortes ocasionadas pela falta de saneamento básico. A população desconhecia as invenções que eram realizadas no exterior para tornar viável a vida nas cidades, sendo adotados métodos nada higiênicos para se viver. As famílias, por não possuírem banheiros, coleta de lixo apropriada e consciência da preservação, acabavam vivendo em meio a sujeiras e doenças. O problema era ainda maior nos períodos de chuva de verão, onde surgiam mais mosquitos e, com eles, mais doenças. Viver no século XIX no Brasil, principalmente na cidade do Rio de Janeiro, era arriscado, pois não havia maneiras de se escapar das doenças ocasionadas pela sujeira. (ALENCASTRO, 2008)
As doenças causadas pela falta de saneamento básico nas cidades e a acumulação de detritos ao longo das ruas, fez com que a reforma urbana fosse adotada. Tal reforma consistia em reorganizar a maneira com que os dejetos eram recolhidos, se tornando obrigatório, em todas as residências, encanamentos diversos para a coleta dos dejetos e o fornecimento de água, alterando a forma de se viver nas cidades. Não mais haveria doenças causadas pelas sujeiras, os turistas poderiam freqüentar as cidades sem necessitarem de lenços para taparem as narinas, devido aos odores fortes presentes nas cidades, as sujeiras, que antes tomavam conta das ruas, agora ficariam em locais apropriados.
Percebe-se que o homem aprendeu, pela própria experiência, que a água suja, o lixo e outros resíduos podiam transmitir doenças e começou, assim, a adotar medidas para dispor de uma água limpa e livrar-se dos detritos. A higiene passou a ser adotada como medida preventiva contra doenças, dando origem ao saneamento básico.
Em Paris a utilização de água encanada começou em 1865, os banheiros possuíam vasos e bacias para utilização no dia-a-dia, e lavar as mãos tornou-se uma obrigação social. A partir dos conceitos utilizados por Roger Chartier , percebe-se que os indivíduos se apropriam de determinados conceitos, valorizando as mentalidades coletivas, dando aporte à conformação das práticas sanitárias como práticas culturais, no que diz respeito às representações sobre saúde e higiene difundidas nas primeiras décadas do século XX.
A invenção do encanamento moderno e o desenvolvimento do saneamento estão relacionados ao surgimento e crescimento das cidades. Graças ao desenvolvimento da ciência e da tecnologia no século XX, as fontes contaminadas, após serem tratadas, tornam-se potáveis novamente possibilitando, dessa forma, a sua renovação e a profilaxia de doenças.
Mas, nem todas as cidades adotaram o uso dos encanamentos como forma de melhorar a qualidade de vida da população. Talvez por falta de verba ou incentivos públicos, de acordo com dados da Pesquisa Nacional de Saneamento Básico – IBGE, divulgada em 2002, ainda existem, no Brasil, cidades com um precário sistema de encanamento, ocasionando um saneamento deficitário. Na falta de encanamentos que possam realizar a coleta de resíduos, o transporte de água, entre outros, a população vai se adequando ao que é oferecido. A construção de latrinas próximas aos rios e córregos, o uso de cisternas para o armazenamento de água é, ainda hoje, uma realidade brasileira.

REFERENCIAS

IBGE. Disponível em: Acesso em: 15 de maio de 2010.
ALENCASTRO, Luiz Filipe de. Vida privada e ordem privada no Império. In.: História da vida privada no Brasil Império: a corte e a modernidade nacional. São Paulo: Cia das Letras, 2008, pp. 67-78.
BLOCH, Marc Léopold Benjamin. Apologia da história ou o ofício de historiador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2002. 159 p.
CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Lisboa: Difel, 1990. 244 p. (Memória e Sociedade).
MUMFORD, Lewis. A cidade na história: suas origens, suas transformações, suas perspectivas. Belo Horizonte: Itatiaia, 1965. 2v.

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